Bragança: Coletivo de moradores denuncia tentativa de desmobilização.
Assembleia Geral do Coletivo Canaã, Bragança-PA |
Um Coletivo Social de moradores na cidade de Bragança, nordeste do Pará, denunciou na sexta-feira (último dia do mês de maio), uma tentativa de desmobilização.
O Coletivo Canaã, como identificado por seu Estatuto Social, fora constituído por integrantes de uma área de expansão urbana, a fim de lutar pelo direito à habitação.
A mobilização ganhou força após as constantes ameças de reintegração de posse, impetrada judicialmente mediante uma ação movida por Benedito de Deus Salomão (De cujus), e levada à diante pelo seu inventário.
A suspeita da liderança central do Coletivo é de que algum residente, esteja ligado a membros da família do falecido, atuando como mediador. Levando, supostamente, informações da comunidade para a parte autora do processo, a fim de promover "o caos", ao propalar informações descontextualizadas, impetrando o medo de despejo nos moradores, com o objetivo maior de provocar "a desmobilização do movimento". Já que a tática de dividir, para desestruturar uma luta social, é uma prática antiga, muito utilizada durante a época da Ditadura Militar, porém muito frequente nos dias atuais.
O estopim, segundo informou os representantes do Coletivo Canaã, foi a disseminação, por aplicativo de mensagens, de um documento expedido por um escritório de advocacia, que coincidentemente advoga para a família do finado, onde consta um pedido ao juizado de "cumprimento de liminar".
Segundo a pessoa que divulgou, esse documento consistia numa ordem judicial que supostamente comprovava que "as famílias seriam expulsas de suas casas mediante força policial, através dessa liminar". Ou seja, em uma clara confusão entre o pedido de um advogado com a expressa ordem de um juiz.
Uma decisão liminar, é aquela proferida por juiz em caráter de urgência, para garantir ou antecipar um direito que tem perigo de ser perdido.
Pode ser concedida com base na urgência ou evidência do direito
pleiteado. É uma decisão temporária, pois depende de confirmação por
sentença de mérito.
Superficialmente, o fato poderia ser encarado apenas como mero descuido por "desinformação", já que a maioria dos brasileiros possui dificuldade em compreender os trâmites processuais e o emprego de jargões jurídicos.
Entretanto, relatos e "prints" de outros moradores, indicam que essa mesma pessoa, vem atuando há algum tempo, para descredibilizar não apenas as lideranças do Coletivo, mas também a estratégia de defesa, utilizada pelo advogado que representa os interesses dos moradores. O que aduz uma ação deliberada em atrapalhar a mobilização social.
As Leis brasileiras tipificam como crime o ato de espalhar notícias falsas, como o Artigo 138 e o Artigo 140, do Código Penal, podendo resultar em prisão.
Por que a luta por direito à moradia é legítima?
Atualmente, na área ocupada há 6 anos, de aproximadamente 4.000 m², residem algo em torno de 120 famílias hipossuficientes, que encontraram naquele lugar, um espaço para erguerem seu lar.
Área da ocupação Jd. Canaã |
No Brasil, o Direito à moradia foi incluído na Constituição Federal de 1988, através da Emenda Constitucional nº 26, de 2000 e não se restringe a apenas um teto e quatro paredes, já que todas as pessoas têm o direito de acesso a um lar e comunidade seguros para viver em paz, onde coexista dignidade com saúde física e mental.
Um ponto essencial no entendimento do legislador, consiste no princípio da "segurança da posse". Ou seja, todas as pessoas têm o direito de morar sem o medo de sofrer remoção, ameaças indevidas ou inesperadas. Acrescido do princípio de não discriminação e priorização de acesso à moradia por grupos vulneráveis economicamente.
Outro ponto de fundamentação, encontra-se na questão de que no Brasil não é comum a cultura da propriedade, mas do direito de uso. O que é possível constatar ao se analisar as diversas decisões colegiadas envolvendo o direito agrário. Ao se associar a necessidade de uma moradia com a aquisição de uma vida digna, entende-se o direito à moradia como um direito social. No ano de 1991 a ONU, através do Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, referendou esse entendimento.
Também a Lei Federal nº 4132/1962 cita explicitamente no Art. 1° que a desapropriação de áreas por interesse social deve ser decretada para promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar seu uso ao bem-estar social na forma do Art. 147 da Constituição Federal.
No Art.2°, inciso I, o mesmo dispositivo esclarece que pode ser enquadrado como "área de interesse social" o aproveitamento de todo bem improdutivo ou explorado sem correspondência com as necessidades de habitação, trabalho e consumo dos centros de população.
No caso da ocupação do Jardim Canaã, imagens de satélite apontam que desde quando o proprietário homologou no Registro Público a compra do terreno no ano de 2016, nunca foi feito nenhuma benfeitoria. Senão, aquelas cujo produto tenha sido resultado da ocupação, objeto de contencioso judicial.
O nosso departamento de jornalismo segue acompanhando o caso.