É urgente a necessidade da humanidade redescobrir o valor da criação
Há pouco mais de cinco décadas as preocupações envolvendo as questões ambientais, integram a pauta de uma centena de organizações locais, nacionais e internacionais.
Em contrapartida, os problemas relacionados ao planeta terra não param de se avolumar, o que demonstra pouco convencimento de que a humanidade está de fato se autodestruindo.
A jornalista Raquel Carson, foi uma das pioneiras ao defender o pleito referente aos riscos da atividade humana para o equilíbrio ecossistêmico, ao publicar o livro "Primavera Silenciosa", em setembro de 1962. Onde denuncia os efeitos deletérios dos pesticidas, no equilíbrio natural.
Tive contato com esta obra enquanto estudante do curso de Mestrado em
Ciências Ambientais e Desenvolvimento Sustentável, o que me leva a
categorizá-la como sendo, ainda uma obra futurista, posto que a luta
contra o antropismo¹, parece estar longe de ter êxito.
"Hoje, preocupamo-nos com uma espécie diferente de risco, que perpassa pelo nosso meio ambiente: Um risco que nós mesmos introduzimos em nosso mundo, na medida em que nosso moderno estilo de vida veio evoluindo e formando-se" (CARSON, 1962, p. 195).
Fica evidente que tudo o que vem ocorrendo ao planeta terra é única e exclusiva responsabilidade dos próprios seres humanos, que em nome da cobiça e da exploração desenfreada dos recursos naturais, colocou em xeque o equilíbrio ecossistêmico.
Ecologia está longe de ser um conceito próximo daquilo que alguns críticos chamam de "neurose ambiental". Ecologia é primeiro, inter-relação.
Trata-se da ciência que explica os termos em que se estabelecem as trocas e interações entre os seres vivos. Insano é ignorar o fato de que tudo na natureza está perfeitamente amarrado!
Em 1864, um presidente dos Estados Unidos da América, efetuou uma proposta a uma tribo de índios, de comprar suas terras, dando em troca outra reserva.
A resposta do Cacique Seatle, líder dessa tribo, é conhecidamente um dos mais belos textos da luta em defesa da ecologia. "O que ocorrer com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não tramou o tecido da vida; ele é simplesmente um de seus fios. Tudo o que fizer ao tecido, fará a si mesmo" - Afirmou o líder.
A consciência desse caráter inter-relacional, que mantém dependente uns seres dos outros na teia da vida, é sem dúvida um dos principais elementos do axioma que inspira o respeito e o cuidado com a criação.
Cuidar do mundo e todas as suas formas de vida é cumprir o sagrado desígnio humano, dado pelo próprio Deus. É uma atitude espiritual, que externa profunda gratidão ao criador por tudo o que deixou a nós, por amor. Como deixa claro Francisco de Assis, no cântico das criaturas: "Louvado sejas, meu Senhor, Com todas as tuas criaturas" (Fontes Franciscanas, 263).
Seguindo as pegadas do jovem de Assis, o papa Francisco, em sua encíclica "Laudato Si", critica veementemente a forma desarmoniosa com que a humanidade vem tratando a mãe terra:
"Esta irmã clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou. Crescemos a pensar que éramos seus proprietários e dominadores, autorizados a saqueá-la. A violência, que está no coração humano ferido pelo pecado, vislumbra-se nos sintomas de doença que notamos no solo, na água, no ar e nos seres vivos. Por isso, entre os pobres mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que « geme e sofre as dores do parto » (Rm 8, 22). Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2, 7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos" (LS, 2).
O Art. 225 da Constituição Federal do Brasil, promulgada em 1988, reza
que "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida" enquanto pouca efetividade resulta das políticas públicas de meio ambiente no país.
É urgente a necessidade de redescobrirmos, enquanto humanidade, o valor da criação. Repito insistentemente que esse posicionamento não se trata de uma questão simplesmente religiosa, mas sim espiritual e, acima de tudo: disto depende a sobrevivência das gerações presentes e futuras.
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¹ Antropismo é a doutrina ou escola de pensamento filosófico que consiste no estudo dos princípios que consideram o homem contrário a toda a natureza e semelhante a Deus. Pode-se denominar também de antropismo o conjunto desses mesmos princípios.
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